O que é o mundo? Quando falamos da existência de um "mundo interior" e de um "mundo exterior", timidamente, mas também legitimamente, acaba por surgir esta questão. Pessoalmente, sinto uma certa dissonância cognitiva quando ouço falar de uma tal divisão. E, embora esta abordagem seja legítima e mesmo intuitiva, não corresponde à minha visão do mundo.
A questão é que a comparação dos mundos "interior" e "exterior" implica a existência de dois mundos, entre os quais estará uma certa linha, uma faixa divisória. Mas será assim? Não é o mundo, um só, inteiro? Ao escrever estas linhas, não estarei eu a afirmar os meus pensamentos que, poderíamos supor, me pertencem apenas a mim internamente? Mas não, por mais profundos e íntimos que sejam os meus pensamentos, eles manifestam-se em objectos externos. Vejo as minhas reflexões sob a forma de texto no ecrã de um portátil. Tu, meu leitor, deparas-te com elas no artigo. Além disso, é pouco provável que pronuncies este texto em voz alta. Com um elevado grau de probabilidade, estás a lê-lo para ti próprio. Ou seja, o que inicialmente poderia ser designado como "os meus pensamentos internos" tornou-se agora propriedade dos teus pensamentos. Podes até experimentar emoções em relação a eles, o que marca uma maior indefinição das fronteiras entre mim e ti. Isso está a acontecer em mim, e não em mim, em ti, e não em ti ao mesmo tempo. Este acontecimento entre mim e ti está além do interior ou exterior. É a propriedade daquilo de que eu e tu fazemos parte. Qualquer dos nossos pensamentos ou experiências está associado a objetos além do nosso controlo. A totalidade destas ligações forma algo unificado, comum e interligado. O mundo é um conjunto de conexões tão grande, diverso, complexo e com múltiplos níveis.
Talvez pudéssemos parar por aqui, mas depois do que foi dito, é preciso fazer mais uma pergunta. Como é que o mundo é um só e nos inclui a ambos, mas a reação emocional ao mesmo objecto é diferente para todos? Afinal, vendo a mesma imagem ou lendo o mesmo texto, cada um de nós reage emocionalmente ao mesmo de forma diferente do outro. Além disso, o mesmo objecto pode causar sentimentos fortes e diametralmente opostos em duas pessoas diferentes. Como é que um olha para os acontecimentos da guerra na Ucrânia e se torna agressivo, o outro lamenta, o terceiro fica triunfante e o quarto se sente culpado? A justificação está na rede já existente de ligações que se estabelecem na nossa visão do mundo entre os seus vários objectos. A ligação entre conceitos como pátria, nação, inimigo, país, eu, Europa, Ásia, Oriente, Ucrânia... e muitos outros depende da nossa reação, vinda de dentro e virando-se para fora.
Por vezes as ligações entre objectos são ilusórias, outras vezes estão erradas. Muitas vezes estas ligações não são de todo estabelecidas por nós, mas induzidas pela cultura através dos pais, TV, livros, YouTube ... Em alguns raros casos, estas ligações são construídas por nós, pessoalmente, através da compreensão dos pontos de vista, ações e eventos daquilo que estamos a enfrentar. Isto não acontece com frequência, pois requer esforço, tempo, perseverança, responsabilidade e coragem para pensar de acordo com uma nova perspetiva. Para tal, é necessário redefinir as palavras que utilizamos, de forma a dar novas interpretações aos objectos que nos moldaram; encontrar pessoas que pensam de forma diferente de nós. Devemos encontrar contradições no nosso pensamento. É necessário repensar regularmente as verdades existentes, nas quais nos baseamos involuntariamente, e mudar a nossa forma de agir de acordo com novos pontos de vista.
Reunir o mundo a partir dos pequenos fragmentos das ideias de pensadores antigos, dos vestígios não relacionados das crenças de velhas religiões, e dos fragmentos desconexos das ideias de longa data de gerações anteriores é uma tarefa necessária para o praticante moderno. Ao dividir-se e testar-se criticamente contra a realidade, a linha entre o interno e o externo é apagada.
Dmitry Danilov
Ukrainian Federation of Yoga
Team of «Yogis Without Borders»
Vice-presidente da UEY
(Traduzido por Cristina Ferreira, Joana Oliveira e Tânia Ribeiro)
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